terça-feira, 26 de outubro de 2010

O PROPÓSITO


Como começar a construir uma cosmovisão (Visão de Mundo) cristã? A passagem fundamental é a narrativa da criação em Gênesis, porque é o ponto que devemos examinar a fim de aprender qual era o propósito original de Deus ao criar a raça humana. Com a entrada do pecado, os seres humanos saíram do trajeto, afastaram-se do caminho, perderam-se. Porém, quando aceita¬mos a salvação em Cristo, somos recolocados no caminho certo e restau¬rados ao nosso propósito original. A redenção não é somente ser salvo do pecado, mas também ser salvo para algo — retomar a tarefa para a qual fomos originalmente criados.

E qual era a tarefa? Em Gênesis, Deus dá o que chamaríamos de a primeira descrição de cargo: "Frutificai, e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a..." (Gn 1.28) A primeira frase - "Frutificai, e multiplicai-vos"; significa desenvolver o mundo social: formar famílias, igrejas, escolas, cidades, governos, leis. A segunda frase - "enchei a terra, e sujeitai-a"; significa subordinar o mundo natural: fazer colheitas, construir pontes, projetar computadores, compor músicas. Esta passagem é chamada de o mandato cultural, porque nos fala que nosso propósito original era criar culturas, construir civilizações; nada mais.

Isto significa que nossa vocação ou trabalho profissional não é uma atividade de segunda classe, algo que fazemos para pôr comida na mesa. É a grande obra para a qual fomos criados. O modo como servimos ao Deus Criador pode ser demonstrado ao utilizarmos, com criatividade, os talentos e dons que Ele nos deu. Poderíamos dizer que somos chamados a continuar a obra criativa de Deus. Claro que não criamos do nada, “exttihilo” (do nada), como Deus fez; nosso trabalho é desenvolver a capacidade e potencial que Ele construiu na criação, usando madeira para edificar casas, algodão para fazer roupas ou silício para fazer chips de computador. Embora as modernas instituições sociais e econômicas não se refiram explicita¬mente ao jardim do Éden, sua justificação bíblica está fundamentada no mandato cultural.

Nos primeiros seis dias da narrativa de Gênesis, Deus forma e enche o universo físico: o céu com o sol e a lua, o mar com as criaturas natatórias, a terra com os animais terráqueos. Então, a narrativa faz uma pausa, como a enfatizar que o próximo passo será a culminação de tudo que fora criado. Esta é a única fase no processo criativo em que Deus anuncia com antecedência seu plano, quando os membros da Trindade consultam entre si: "Vamos fazer uma criatura 'à nossa imagem' que nos represente e continue nosso trabalho na terra" (cf. Gn 1.26). Em seguida, Deus cria o primeiro casal humano para ter domínio sobre a terra e governá-la em seu nome.

O texto deixa claro que os seres humanos não são governantes supre¬mos, livres para fazer tudo que desejarem. Seu domínio é uma autoridade delegada — eles são representantes do Governador Supremo, chamados para refletir seu cuidado santo e amoroso para com a criação. Eles têm de "cultivar" (palavra que tem o mesmo radical que "cultura") a terra (Gn 2.15, ARA). O modo como expressamos a imagem de Deus pode ser demonstrado pela nossa criatividade e maneira de construir culturas.

Este era o propósito de Deus quando criou o ser humano, e até hoje continua sendo seu propósito para nós. O plano original de Deus não foi cancelado pela queda. O pecado corrompeu cada aspecto da natureza humana, mas não nos fez menos que humanos. Não somos animais. Ainda refletimos "por espelho" (1 Co 13.12),"obscuramente" (ARA), nossa na¬tureza original como portadores da imagem de Deus. Até os não-cristãos executam o mandato cultural — eles "se multiplicam e enchem a terra", ou seja, casam-se, constituem famílias, abrem escolas, dirigem negócios. E também "cultivam a terra" — consertam carros, escrevem livros, estudam a natureza, inventam novos dispositivos.

Após uma conferência que dei, certa jovem me disse: "Quando você fala sobre o mandato cultural, não diz nada categoricamente cristão; essas são coisas que todo o mundo faz".
Mas é isso mesmo que quero dizer: Gênesis nos fala de nossa verdadei¬ra natureza, das coisas que não podemos deixar de fazer, do modo como Deus criou cada ser humano com um fim específico. Nosso propósito é precisamente cumprir nossa natureza dada por Deus.

A queda não destruiu nosso chamado original, porém o tornou mais difícil. Nosso trabalho é marcado por tristeza e labores. Em Gênesis 3.16,17, o original hebraico usa a mesma palavra para referir-se à "dor" do parto e à "dor" de cultivar alimentos. O texto dá a entender que as duas tarefas centrais da maioridade — criar a próxima geração e ganhar a vida — estarão repletas da dor de viver em um mundo caído e despedaçado. Todos os nossos esforços serão distorcidos e mal orientados pelo pecado e egoísmo.

Quando Deus nos redime, Ele nos liberta da culpa e do poder do pecado, e restaura nossa plena humanidade, de forma que possamos cum¬prir as tarefas para as quais fomos criados. Por causa da redenção de Cristo na cruz, nosso trabalho assume um novo aspecto, pois torna-se um meio de participar dos seus propósitos redentores. Ao cultivarmos a criação, recuperamos nosso propósito original e trazemos uma força redentora para anular o mal e a corrupção que entraram pela queda. Oferecemos nossos dons a Deus para tomarmos parte em fazer com que seu Reino venha e sua vontade seja feita. Com coração e mente renovados, nosso trabalho pode ser inspirado pelo amor a Deus e deleite em seu serviço.

A lição do mandato cultural é que nosso senso de cumprimento de¬pende de nos dedicarmos ao trabalho criativo e construtivo. A existência humana ideal não é lazer eterno ou férias infinitas — ou um recolhimen¬to monástico em oração e meditação —, porém esforço criativo gasto para a glória de Deus e benefício dos outros. Nosso chamado não é so¬mente "ganhar o céu", mas também cultivar a terra; não só "salvar almas", mas servir a Deus pelo trabalho que fazemos. Pois o próprio Deus está comprometido no trabalho de salvação (graça especial) e no trabalho de conservação e desenvolvimento de sua criação (graça comum). Quando obedecermos ao mandato cultural, participaremos do trabalho do pró¬prio Deus, como agentes da sua graça comum.

Este é o rico conteúdo que deve vir à nossa mente quando ouvirmos a palavra redenção. O termo não se refere ao episódio de conversão ocorrido em determinado tempo. Significa alistar-se no empenho vitalício de dedicar nossas habilidades e talentos à construção de coisas que sejam bonitas e úteis, ao mesmo tempo em que combatemos as forças do mal e do pecado que oprimem e distorcem a criação. O livro "E Agora, Como Viveremos?" acrescenta uma quarta categoria: criação, queda, redenção e restauração, para enfatizar o tema da vocação contínua. Certos teólogos sugerem que a quarta categoria deveria ser glorificação, pois assim atentaríamos para nossa meta final de morar nos novos céus e na nova terra, para a qual nosso trabalho aqui é uma preparação.

Qualquer que seja o termo que usemos, ser cristão significa embarcar em um processo vitalício de crescimento na graça em nossa vida pessoal (santificação) e em nossa vocação (renovação cultural). Os novos céus e a nova terra serão a continuidade da criação que hoje conhecemos — purificados pelo fogo, mas re-conhecidamente os mesmos, assim como Jesus era reconhecível no corpo da sua ressurreição. Como C. S. Lewis diz, em sua obra As Crônicas de Nárnia, começamos uma grande história de aventura que nunca termina¬rá.Trata-se da "Grande História que ninguém na terra leu —que continua para sempre — na qual todo capítulo é melhor que o anterior"."'

Nancy Pierce
retirado do Livro: Verdade Absoluta CPAD)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

PECADOS SEXUAIS

SINAIS DO HOMEM ESPIRITUAL


O conceito de espiritualidade varia entre os diversos grupos cristãos. Em alguns círculos, a pessoa que fala incessantemente de reli¬gião é julgada como sendo muito espiritual. Outros aceitam a exuberância ruidosa como um sinal de espiritualidade, e em algumas igrejas, o homem que ora em primeiro lugar, por mais tempo e mais alto consegue uma reputação de ser o mais espiritual na assembléia.

Um testemunho vigoroso, orações freqüentes e louvor em voz alta podem entrosar-se perfeitamente com a espiritualidade, mas é importante entendermos que em si mesmos eles não constituem nem provam a presença da mesma.

A verdadeira espiritualidade manifesta-se em certos desejos dominantes. Eles são desejos sempre presentes, fixos, suficientemente poderosos para dominar e controlar a vida da pessoa. Para facilitar, vou mencioná-los, embora não me esforce para decidir sua ordem de importância.

1. Primeiro, o desejo de ser santo em lugar de feliz. A busca da felicidade, tão difundida entre os cristãos que professam uma santidade superior é prova suficiente de que tal santidade não se acha presente. O homem verdadeiramente espiritual sabe que Deus dará abundância de alegria no momento em que possamos recebê-la sem prejudicar nossa alma, mas não exige obtê-la imediatamente.

2. O indivíduo pode ser considerado espiritual quando quer que a honra de Deus avance por meio de sua vida, mesmo que isso signifique que ele mesmo tenha de sofrer desonra ou perda temporárias. Um homem assim ora: "Santificado seja o teu nome", e acrescenta baixinho: "Qualquer seja o custo para mim, Senhor". Ele vive para honrar a Deus, através de uma espécie de reflexo espiritual. Cada escolha envolvendo a glória de Deus, para ele já está feita antes de apresentar-se. Não é necessário que debata o assunto em seu íntimo, pois nada há a discutir. A glória de Deus é necessária para ele; ele a aspira como alguém sufocando-se aspira o ar.

3. O homem espiritual quer carregar a sua cruz. Muitos cristãos aceitam a adversidade ou a tribulação com um suspiro e as chamam de sua cruz, esquecendo de que tais coisas podem acontecer tanto a santos como a pecadores. A cruz é aquela adversidade extra que surge como resultado de nossa obediência a Cristo. Esta cruz não é forçada sobre nós; nós voluntariamente a tomamos com pleno conhecimento das conseqüências. Nós decidimos obedecer a Cristo e fazendo essa escolha, decidimos carregar a cruz.
Carregar a cruz significa ligar-se à Pessoa de Cristo, ser fiel à soberania de Cristo e obediente aos seus mandamentos. O indivíduo espiritual é aquele que manifesta essas características.

4. O cristão espiritual é também aquele que tudo observa sob o ponto de vista de Deus. A capacidade de pesar tudo na balança divina e dar-lhes o mesmo valor dado por Deus, é o sinal de uma vida cheia do Espírito.
Deus olha para tudo e através de tudo ao mesmo tempo. Seu olhar não repousa sobre a superfície mas penetra até o verdadeiro significado das coisas. O cristão carnal olha para um objeto ou uma situação, mas pelo fato de não ver através dela fica entusias¬mado ou deprimido pelo que vê. O homem espiritual tem capacidade para ver através das coisas como Deus vê e pensar nelas como Ele pensa. Ele insiste em ver tudo como Deus vê, mesmo que isso o humilhe e exponha a sua ignorância até o extremo de fazê-lo sofrer.

5. Outro desejo do homem espiritual é morrer retamente em lugar de viver no erro. Um sinal seguro do homem de Deus ama¬durecido é de sua despreocupação com a vida. O cristão terreno, consciente do corpo, olha para a morte com terror no coração; mas à medida que continua vivendo no Espírito torna-se cada vez mais indiferente ao número de anos que vai viver aqui embaixo, e ao mesmo tempo cuida cada vez mais do modo como vive enquanto está aqui. Não irá comprar alguns dias extra de vida ao custo da transigência ou fracasso. Quer acima de tudo ser reto, e fica feliz em deixar que Deus decida quanto tempo deve viver. Ele sabe que pode morrer agora que está em Cristo, mas sabe que não pode agir erradamente, e este conhecimento torna-se um giroscópio que dá esta-bilidade aos seus pensamentos e seus atos.

6. O desejo de ver outros progredirem com sua ajuda é outro sinal do homem que possui espiritualidade. Ele quer ver outros cris¬tãos acima de si e fica feliz quando estes são promovidos e ele negligenciado. Não existe inveja em seu coração; quando seus irmãos são honrados fica satisfeito, por ser essa a vontade de Deus e essa vontade é seu céu na terra. O que é agradável a Deus lhe dá também prazer, e se for do agrado de Deus exaltar outrem acima dele, satisfaz-se com isso.

7. O homem espiritual faz no geral juízos eternos e não temporais. Pela fé supera o poder de atração da terra e o fluxo do tempo e aprende a pensar e sentir como alguém que já deixou o mundo e foi juntar-se à imensa companhia dos anjos e à assembléia e igreja dos primogênitos arrolados nos céus. Um homem assim preferiria ser útil e não famoso, servir em lugar de ser servido.

Tudo isto se realiza pela operação do Espírito Santo que nele habita. Homem algum pode ser espiritual por si mesmo. Apenas o Espírito da liberdade pode tornar o homem espiritual.

A.W. Tozer - Do livro "O melhor de Tozer"